quinta-feira, 22 de abril de 2010

«Puramente quimérica» - Parte I


O teu rosto fedia a “Besta” incompleta puramente quimérica, de olhos rasgados em genitais desejos promíscuos. Queimavas o meu útero de menina nas entranhas da seriedade do teu porte burguês como se bebesses num trago só, toda a minha chaneza.
O meu sangue salivava a tua gargalhada, exibindo o dente de ouro que roubaras de outra virgindade …como pudeste pensar que uma menina como eu te daria tanto prazer se apenas me obrigaste a ser mulher …suicidei a cólera que me possuía e possui-me da polidez.

Não me deixei cair na mesquinhez de lamentações fúteis, os meus olhos negros escondiam uma menina órfã que rapidamente moldava uns belos seios de mulher, desejei-os antes de os entregar à ira da mediocridade dos ladinos. Quis ser a primeira a tocar-lhes; sem pudor despi-me em frente ao espelho, (única peça que adornava o meu quarto), suavemente deslizei os dedos sobre os meus mamilos adornados de seda, endurecidos de deleite pediam-me que me penetrasse, e, num vaivém de uma dança mística amei o meu corpo pela primeira vez, brindei-me com um cocktail de sabores delirantes.

Finalmente tinha-me encontrado com o meu corpo, ergui-o da vegetação, da pena incondicional a que o entregara com nojo de ser mulher. O mundo da “Besta” incompleta que me paralisara tinha fenecido, no momento em que pari a própria vontade de me parir; jurei não rezar mais hóstias bolorentas nem jejuar a fome da impunidade de um cão que se ajoelhava na missa à caça de mais um petiz para o seu cardápio. Voltei pela última vez ao adro da igreja, precisava de olhar-lhe, (no olho que ainda lhe restava), nesse preciso instante tive a certeza que o seu sadismo não coligia rostos.

A igreja continuava intocável, ajoelhei-me aos pés da minha meninice, enquanto um pai-nosso saía a ferros da boca do inferno dos mais devotos, todos comiam o corpo de Cristo, e, bebiam sagazmente os meninos do coro em glória a Deus. O padre bajulava os feitos da caridade do seu rebanho negro, abençoava-os com a carne mais tenra, a mais pura, com que ostentava a sua divindade em benefício do próximo.
A missa terminara; os in(fiéis) cumprimentavam-se, assim mandava a palavra do senhor.

Mathilde Gonzalez - pseudónimo literário de Conceição Bernardino

2 comentários:

KrystalDiVerso disse...

Os confessionários são exíguos!... Quando muito, cabe um voto de castidade quebrado e um devoto a quebrar!... Há lugar privilegiado para as carnes de tenras mães que suportam o próprio olhar através de uma “rede” que separa os rostos, tornando-os vícios incógnitos!... Por isso não existem.
A tentação ajoelha-se num acto de fé e lê contínuas Avé Marias, só Avé Marias, em palavras coladas lá no alto, entre os lábios febris de um pecado de traição!... Jesus Cristo continua pregado na cruz e há sempre um falso apóstolo vestido de bordados de ouro encarregado de verificar os Cravos que o seguram e o aprisionam!... Não vá o diabo tecê-las e Ele se desprega da Cruz!
No exíguo confessionário sombrio, o pecado escapa ao castigo e o acto de contrição é desnecessário!...
Os Pai Nossos são proibidos!
Entregue-se o corpo ao espelho!... Por enquanto, no pecado do desperdício!





Escolha entre... beijos e abraços

Guacira Maciel disse...

FANTÁSTICO!
Conceição, que lucidez analítica e que consciência de realidade. muito bome belo...momentos deextrema delicadeza, sutil sensualidade.
Beijo,
Guacira.